quinta-feira, 21 de maio de 2009

AÇÃO DIRETA E A REVOLUÇÃO

No discurso dos partidos da “esquerda” brasileira contemporânea o assunto da revolução socialista no Brasil e nos países do terceiro mundo tornou-se algo definitivamente descartado, entendido como uma questão ultrapassada, anacrônica, enfim, um erro resultante de um romantismo juvenil “irresponsável e inconseqüente” das gerações das décadas de 60/70 .

Hoje o que predomina na avaliação e na prática desses setores e agrupamentos políticos, que afirmam ter “amadurecido ideologicamente”, é a lógica pragmática da política do possível, ou seja, aquela que supostamente pretende galgar progressivamente pequenos avanços políticos e sociais dentro do sistema e da estrutura burguesa, através do fortalecimento da dita “sociedade democrática de direito” (entenda-se, porém: sociedade capitalista, democrática(mente) burguesa, de direito para as elites).

Argumentam que, na atual realidade conjuntural mundial, somente esses pequenos avanços reformistas são passíveis de realização e que com o seu acumulado é que será possível alcançar, a médio e longo prazo, mudanças efetivas na sociedade como resultado do “acuamento” das elites capitalistas. Acredita-se que essas elites, para garantirem a sua sobrevivência enquanto classe, forçadas pelos avanços democráticos, se obrigarão cada vez mais a abrir mão dos seus mecanismos de poder e dos seus privilégios, fortalecendo, concomitantemente, política e economicamente a classe oprimida.

Na minha opinião essa é uma visão, no mínimo, ingênua, para não dizer entreguista e oportunista. Pois a velha história da humanidade vem farta de exemplos contrários, de tentativas de “avanços dentro da ordem” que não só nunca foram bem sucedidas como também acabaram rapidamente desvirtuando-se totalmente, (re)fortalecendo inclusive setores desgastados das elites dominantes clássicas e/ou criando novos agentes dominantes.

Entendo que não há saída verdadeira para a barbárie provocada pelo sistema capitalista enquanto as esquerdas – as que ainda se afirmam socialistas ou pelo menos anticapitalistas - não abandonarem de vez e definitivamente a velha avaliação sedutora da viabilidade da disputa com as elites dentro das regras por elas estabelecidas. Pois nessa luta entre “espertos” a história tem demonstrado que a cartada final sempre é de quem estabeleceu as regras vigentes da disputa.

Portanto, a tarefa essencial do anticapitalista e, sobretudo, do socialista é estrategicamente elaborar, construir e ir consolidando pacientemente um “jogo novo” cujas regras, desta vez, ao contrário do que ocorre hoje, sejam impostas ao adversário burguês.

Por exemplo, se a burguesia quer nos obrigar (ou nos seduzir) a jogar no campo da ordem da democracia representativa, que a forcemos a jogar dentro da lógica da democracia direta, a começar nos diversos organismos (sindicatos, partidos, mandatos, movimentos, agremiações, etc) onde hoje temos inserção e onde a burguesia, não por outro motivo, tem historicamente (e hoje, mais do que nunca) procurado inserir os seus representantes ou cooptar lideranças.

Se a burguesia pretende que atuemos no campo das formalidades (legalidade, institucionalidade, liberdade controlada pela falsa relação entre direitos e deveres, etc) para a garantia de supostas mudanças e melhorias na e da ordem pública, que tenhamos a sapiência de pô-la na defensiva obrigando-a a tentar administrar desastradamente o jogo do que chamo investidas imprevistas. São as inúmeras formas de AÇÃO DIRETA orquestradas que podem ser produzidas pelos diversos movimentos sociais existentes, nas suas micro-atuações e ambientes, em diversas direções táticas e formas de linguagem, centradas no objetivo concreto das melhorias sociais a partir da luta por solução de problemas e demandas específicas.

A importância da imposição sistemática à burguesia de regras de um jogo do qual ela não detém o controle, não está “apenas” (o que já seria muito) em provocar o processo progressivo de fragilização e desgaste dos seus instrumentais repressivos e cooptativos, em virtude destes estarem sendo forçados (e induzidos) a agirem num campo para o qual não foram criados e nem preparados para atuar.

Também, e principalmente, a própria experimentação, por parte dos setores desafiantes da burguesia, de técnicas e métodos cada vez mais apurados capazes de obrigá-la a cair na defensiva, é um elemento fundamental para a construção concreta, a médio e longo prazo, do programa estratégico de um movimento de massas e, possivelmente, de um futuro partido verdadeiramente popular e revolucionário.

O movimento de vanguarda se originará justamente a partir da radicalização, consolidação e aperfeiçoamento das práticas, disseminadas pelos pequenos grupos, dessas referidas técnicas e métodos de confronto e ofensiva direta à ordem oficial, bem como a partir da sua capacidade e sensibilidade de aglutinar, numa única força, as inúmeras explosões das iniciativas de ação advindas dos meios populares, multiplicadas umas pelas outras no seio da sociedade.

Essas iniciativas serão motivadas, a médio prazo, pela demonstração evidente da eficácia dos seus resultados práticos e concretos. Será percebido que tais resultados vão muito além dos “serviços” e “bem estar” que o Estado burguês diz ser tudo que pode oferecer aos indivíduos e à população (e que, na prática, sequer o faz).

Nesta prática de ação direta, fundamentalmente vai-se descobrindo que o Estado burguês só existe para proteger e favorecer as elites e roubar, explorar, reprimir, cercear e alienar a população, sobretudo do meio popular, justamente para que ela não adquira condições e nunca aprenda a forma direta de regular a sua própria vida, inclusive sem a necessidade de tutores ou representantes legalmente constituídos.

Deste modo, sim, a partir da construção e consolidação progressiva de regras de ação política direta dos meios populares, alastradas para muito além da capacidade de controle (coação e alienação) da burguesia, é que efetivamente poderemos chegar um dia ao confronto final revolucionário (armado ou não) com as elites e instalar no país, após a vitória, o regime socialista autenticamente democrático que aprofunde tal forma de organização popular.

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